Algo a mais

Eu nasci com algo dentro de mim. Algo que muitas vezes não sei bem o que é, apesar de arder em meu peito, mas que, na maioria das outras, quando a necessidade de um significado atormenta-me a mente, é fácil sintetizar como uma vontade incessante de buscar algo a mais. É importante frisar minhas palavras para que, porventura, eu não venha a ser mal entendida mais tarde (afinal, mal entendidos são uma grande infelicidade): estar em busca de algo a mais não é desprezar o que já tenho e o que já sou, é, pelo contrário, tê-los em tão alta consideração que seria quase como um desmérito estar satisfeita com tão pouco, com tudo o que ainda há para ser e ter. Como já falei, eu não busco algo mais, busco quase o oposto disso: algo a mais. Não para estar um passo à frente de mim mesma, mas para dar um passo adiante - e neste caso, eu estaria assumindo, ainda, tudo o que vivi.
Eu nasci com a pressa de percorrer o mundo só para chegar em casa no final. E então eu tiraria os sapatos e massagearia os pés dormentes, enquanto a sensação valiosa de estar onde sempre quis tomaria, nos meus lábios, a forma irreparável de um sorriso. Faz algum tempo desde que tomei a decisão de ir em frente com isso, porque eu me conheço o suficiente para saber que não vou descansar até chegar ao ponto em que terei de admitir não podê-lo ultrapassar, porque eu sei que enquanto houver caminho a meu alcance, sempre caberá algo a mais na bagagem. E porque eu jamais recusei algo que viesse a me somar. A menos que fosse comida.
Afinal, por mais que procure-se-a, e isso é absolutamente necessário, já sinto admitir em meu coração: satisfação, neste mundo, é ter a barriga cheia - e um lembrete de paciência colado no umbigo.