Sobre riachos

Pele macia, bumbum de nenê. Pálida. A boca um tom de coral e longos cabelos vermelhos vivos sem fim. A menina corria em direção ao riacho nos fins de semana, era sagrado. E nadava até o pôr do sol, a correnteza brincando com o seu corpo e o vento alternando entre o frio e o calor. Gostava daquilo, de se sentir parte do mundo, mesmo que não fosse tanto assim. Para ela, paz significava natureza... e tudo, tudo tinha de ser o mais natural possível.
Até nos dias de tempestade quando seu riacho se revelava capaz de engolir todas as flores das margens continuava a ser seu ponto de refúgio. Porque uma coisa que é sua nunca deixa de ser, nem nos tempos de maior tormenta, nem nos de maior tensão, nem em qualquer outro tempo.
Mas num determinado dia ela precisou ir embora, essa coisa de ir embora acontece muito com as pessoas. E as águas do riacho secaram. A paisagem desmoronou com as tragédias de cada dia.

Só que ainda não foi o fim de história.
Sua mente ingênua a confundia, mas nunca a enganava. Ela sabia de certo que havia outros lugares no mundo onde poderia encontrar coisas boas.
Ainda há e nem todos secam.

Incompreensível como tudo

O engraçado dessa vida é que a gente sempre espera que vamos crescer e passar a entender as coisas, vê-las como realmente são, cada vez de modo mais concreto e, no entanto, quando se vai crescendo, diferentemente de nossas expectativas, acontecem as coisas mais complicadas do mundo. E aí você fica perdido. E aí, você que antes nem ligava para isso, passa a olhar as horas para não chegar atrasado e contar o tempo, e ter de fingir que se importa ou que não. Passa a fazer coisas e depois perguntar a si mesmo o  porquê de as tê-las feito. Tenta achar, ao menos, razão para as nuvens não serem simplesmente algodão, ou para o coração ter que ficar apertado e as lágrimas caírem tão silenciosas agora. Buscando uma explicação para tudo, mesmo sabendo que muita coisa não se explica. Depois não entendem o lance do estresse. Quando o que estiver por perto vira alvo e quem, também, sair de cima, baixo, lados e diagonais é o que deveriam fazer. Mas não. Todo mundo fica lá, sufocando. Não entendem que eu não entendo bulhufas. Não entendem essa sensação de que eu estou numa estufa, acumulando problemas sem solução e vivendo em meio a coisas que não estão no seu devido lugar, ou talvez até entendam e já tenham esquecido. E a vontade de consertar tudo me persegue. Explodir, ando fazendo todo dia. Mas então se já estou tão cheia significa que não tem mais espaço para nada. O que pode acontecer agora é passar.
Quero dizer, ainda não pensei no que faria se piorasse. Já está turbulento demais.